quinta-feira, 29 de março de 2007

DINHEIRO QUE CAI DO CÉU

Juvenal, não o da propaganda do presunto, mas um baiano indolente, que tranquilamente, após o almoço, balançava em sua rede, sempre ouvira falar que dinheiro não cai do céu, mas, naquele dia caiu, e não foi pouco. Na região, conhecida por São Sebastião do Passe-BA, tão pacata, caira um aviãozinho, desses que transportam executivos e dinheiro de bancos.

A explosão foi grande, quebrando a calmaria. Juvenal disse que as pessoas correram ao local do desastre, com espírito solidário, sempre caracterizado pelo povo nessas ocasiões. No local, era só ferro retorcido, ninguém vivo, e, entre os destroços, armas, o que gerou dúvidas, quanto à nave, se era de traficantes, políticos ou algum magnata, enfim, gente de alto gabarito. Um gaiato, ao abrir um malote, surpreendeu-se, era grana a dar com pau. Num breve momento, como num filme, pensou nos filhos, suas dividas, na pobreza e miséria do lugar, não tendo dúvidas de que ia pegar, nem que fosse só um pouquinho do arame. Quando, alguém gritou: -não faça isso homem: -isso não é nosso, deve ter dono, clamando aos céus e invocando Padim Ciço, e outros, lembrando que podia sobrar algum pepino. Mas que nada ! A cobiça era muita, e a necessidade também, então, que se dane, passarinho que come pedra sabe o ânus que tem, pensou. Vamos nessa, só pra ver o que dá. Pior do que ta não pode ficar. Ledo engano.

Pelo que diziam, não se sabe ao certo, afinal o seguro cobre tudo, eram vários milhões de reais. -Vige Maria, quanta bufunfa, pensou, Juva, assim é conhecido na região! A paz acabou pro Juvenal e àquelas paragens, tão calmas. Disseram ao Juva, que tão logo a nave espatifou-se no chão, após rápida constatação do ocorrido, centenas de pessoas iniciaram o saque, fazendo valer o dito de que achado não é roubado, e, alguns invocando o espírito de Lampião, que, diziam, tirava dos ricos e dava aos pobres. Ainda, que se fosse de banco, melhor, pois nessa situação, não tem dono.

Os que puderam, levaram grana, outros, o que podiam e, até as armas, já que seus donos, tinham passado desta pra outra. O buxixo voou, a correria foi grande, afinal grana a granel, evapora rapidamente. Era que nem fim de feira, num salve-se quem puder, cada um procurando ficar com o melhor. Os órgãos de comunicação só falavam do assunto.

De repente, como passe de mágica, da noite para o dia, gente humilde e honesta, passou a ser caçada como vigarista e ladrão. Feito político corrupto. A policia, ciosa de suas relevantes obrigações, tudo fazia, num esforço jamais visto, e de mais a mais, esperando polpuda gratificação, sempre anunciada pelo seguro, e diga-se, dinheiro vindo em boa hora, limpo e sem “bronca”.

A coisa ficou preta, quando ladrões, ou amigos do alheio, passando por policiais, de revolver na cintura, e tudo mais, invadiam casas e barracos, na ganância de achar o tesouro. Não achando a grana, ou o vil metal, levavam tudo que aparecia pela frente, fazendo um verdadeiro arrastão, deixando ladrão carioca e paulista, morrendo de inveja. Juva diz que nessa busca pelo eldorado já não se sabia quem era quem: -Se, policia agindo dentro da lei, se, ladrão travestido de policia, ou se pobre roubando pobre. Juva ficou sem a TV, que aos domingos via os jogos do Vitória, paga a tanto custo com longo carnê das casas Bahia.

Ali perto, próximo ao desastre, o acampamento dos sem terra, virou um inferno. Era nego sendo insultado, de madrugada, na frente dos filhos e levando porrada, a torto e direito, sem saber de onde vinha e, nem por quê. Os caras batiam primeiro e perguntavam depois. Ficou ruim, comprovando-se ao menos, neste caso, que dinheiro só traz desgraça, mesmo vindo dos céus. A paz acabou na região, sempre tão serena.

Eram presos, amigos de Juva, e outros, que nunca imaginaram passar por tal. Juva disse que, até no distrito de Maracangalha, tão cantada nos versos de Caymmi, ali pertinho, foram presos suspeitos armados. Uma pena, pensou Juva, pois muitas vezes, como na musica, foi a Maracangalha, de terno branco, chapéu de palha, mesmo sem a sua Anália, passear e se divertir. Maracangalha, nunca mais será a mesma. Hoje, Juva entende, seu conterrâneo Caetano, quando na musica diz, da força da grana, que constrói e destrói coisas belas.
Brownsugar